Envelhecimento da população exige investimento em saúde – 28/09

Em pouco mais de duas décadas, o número de pessoas com 60 anos ou mais duplicou no Brasil, passando de 15,2 milhões para 33 milhões. Esse incremento na longevidade é positivo, mas também impõe um desafio ao sistema de saúde: como garantir qualidade de vida para uma população que vive cada vez mais, sem colapsar os orçamentos públicos e privados?

Para especialistas reunidos no seminário Inovação no Brasil, realizado pela Folha nesta quinta-feira (25) com o apoio do BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social) e do Sistema Indústria, o caminho passa por diferentes camadas de transformação.

Vão de soluções simples de design ao desenvolvimento de medicamentos de alta complexidade, passando pelo fortalecimento do ecossistema de pesquisa, pelo empreendedorismo e por políticas públicas mais coordenadas.

Fernanda De Negri, secretária de Ciência, Tecnologia e Inovação do Ministério da Saúde, destacou que o envelhecimento populacional coincide com a chegada de terapias cada vez mais sofisticadas e caras. Os biológicos, por exemplo, já representam mais de 30% da carteira de remédios comprados pelo SUS.

“Estamos falando de medicamentos que custam milhões. Isso pressiona os orçamentos e mostra a importância da inovação para oferecer alternativas mais custo-efetivas e ampliar o acesso”, disse a secretária na segunda mesa do seminário, que contou com a mediação de Cláudia Collucci, repórter especial da Folha.

Negri citou iniciativas recentes, como a nova lei de pesquisa com seres humanos (que ainda precisa ser regulamentada), um projeto de estímulo aos estudos de moléculas da biodiversidade brasileira e um centro de competência na tecnologia de RNA mensageiro, capaz de desenvolver vacinas e terapias.

Em vídeo gravado para a abertura do seminário, o presidente do BNDES, Aloizio Mercadante, citou o desenvolvimento de vacinas de RNA mensageiro como uma das prioridades da inovação em saúde no país, junto com antibióticos para combater novas superbactérias resistentes.

Ele afirmou que o investimento do banco no setor em 2024 atingiu um recorde histórico, com R$ 4,9 bilhões. Mercadante citou a suspensão recente de dezenas de pesquisas em vacinas de ponta pelo governo de Donald Trump, nos EUA.

“É uma linha muito promissora, como o Covid demonstrou. O Brasil precisa fazer outras parcerias internacionais e ter pioneirismo, vontade e determinação para avançar nessas linhas de pesquisa”, afirmou.

Uma das vantagens desse tipo de tecnologia são as plataformas modulares, que simplificam o desenvolvimento de biofármacos, acrescentou o geneticista molecular Paulo Amaral, pesquisador do Insper.

Para o especialista, este é o século da biologia, e o Brasil, com sua biodiversidade e diversidade genética, “tem tudo para ser o país da biologia”.

Amaral lembrou, porém, que a velocidade das descobertas científicas é inédita, mas o caminho até chegar ao paciente ainda é longo.

“Nunca houve tanto financiamento voltado ao envelhecimento. Mas, na biotecnologia, os avanços são mais difíceis de serem incrementais. Um medicamento pode levar 15 anos até chegar ao mercado”, afirmou, lembrando que, para isso, é necessário um “capital extremamente paciente”.

A escassez de investimentos de longo prazo dificulta a manutenção de deep techs (empresas baseadas em ciência e tecnologia de ponta) no Brasil, acrescentou Paulo Renato, gerente de inovação do Sebrae Nacional. “Poucos arriscam nesse segmento porque é um capital de risco. Recursos humanos qualificados é um outro desafio, além de regulamentação.”

Também falta integração entre os sistemas de fomento, apontou. “Entre um edital estadual e outro nacional, pode se passar um ano, tempo suficiente para inviabilizar uma pesquisa.”

O setor de saúde e bem-estar é o segundo com mais startups apoiadas pelo Sebrae, atrás apenas do de tecnologia da informação. São empresas que desenvolvem desde aplicativos simples de gestão até novos fármacos no Norte do país. “Estamos criando um grande exército de pequenas empresas inovadoras que podem ajudar muito na melhoria do serviço de saúde no Brasil”, afirmou Renato.

Marco Bego, diretor executivo do InovaHC (hub de inovação da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo), chamou a atenção para um paradoxo.

“As dificuldades de inovar em saúde são enormes, porque é um setor regulado, fechado. Mas talvez seja uma das áreas em que mais precisamos inovar. Existe uma tripla carga de doenças infecciosas, crônicas e ligadas ao envelhecimento da população. É um sistema que vive pressionado e a gente precisa achar alternativas.”

Inovar, para Bego, não é só desenvolver novas drogas, mas transformar serviços e jornadas, digitalizar processos e conectar diferentes setores.

Ele apontou especialmente a necessidade de avançar no compartilhamento e integração de dados dos pacientes. “Temos tentado nos conectar com outras indústrias, como o sistema bancário, que é super-resiliente.”

Apesar dos desafios, Bego destacou também os avanços. “Evoluímos muito. No início, precisávamos explicar o que era inovação. Hoje, discutimos como fazê-la melhor.”

Autoria: FLSP

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