Fazer um intercâmbio não é apenas útil para jovens que querem alavancar sua vida profissional. Pessoas acima de 50 anos, que estão com a carreira consolidada ou até mesmo aposentadas, buscam a experiência para criar vínculos interpessoais e experimentar o novo, enquanto aprendem ou aprimoram uma língua estrangeira.
Elas superam estigmas e etarismo ainda presentes na sociedade, como o mito de que existe um limite de idade para se fazer algo como um intercâmbio.
“Aprender o idioma não é só para o desenvolvimento profissional, mas para estimular o seu cérebro”, diz Denis Buzzi Boehm, diretor nacional da EF Intercâmbios. “Traz um bem tremendo para a saúde mental e social, porque o intercâmbio vai muito além do aprendizado do idioma.”
A psicóloga Larissa Fonseca observa em sua experiência clínica um certo pudor no jovens em fazer coisas sozinhos, seja ir ao cinema, a um restaurante ou viajar. “A partir de uma certa idade, a gente começa a perceber que existimos a partir de nós, e esse julgamento social em andar sozinho e frequentar lugares diminui bastante pela questão de não precisar tanto da validação das pessoas”, diz.
A partir de uma certa idade, a gente começa a perceber que existimos a partir de nós, e esse julgamento social em andar sozinho e frequentar lugares diminui bastante pela questão de não precisar tanto da validação das pessoas
Yara Maria Marques Soares, 75, conta que viaja sozinha desde 2002 e sempre faz amigos pelo caminho. No ano passado, ouviu de uma amiga a possibilidade de fazer um intercâmbio e se interessou.
A advogada, que hoje tem maior flexibilidade no trabalho, decidiu ficar um mês em Roma para desenvolver melhor o italiano, idioma que já praticava por um aplicativo. Durante as quatro semanas, fez amizades da França, da Espanha e da Argentina.
“Tenho amigos em cada país que eu vou, deixo um rastro. [No intercâmbio] Todo mundo fica íntimo, né? Você vai para a aula de aprender a fazer pasta, eu digo que é um recreio no play”, lembra. Yara gostou tanto que neste ano voltou a Roma, desta vez para ficar duas semanas. “Eu já viajo há algum tempo, mas agora eu trabalho menos, só me resta viajar. Eu amo.”
Fonseca destaca que o intercâmbio é um momento para conviver com outras pessoas e dividir experiências, tanto para aprender quanto ensinar. Segundo a psicóloga, conhecer novos lugares e ter uma imersão em uma nova cultura é fundamental para trazer um novo olhar para a vida e devolver uma vitalidade que pode ter se perdido com a idade.
O envelhecimento e amadurecimento podem trazer junto uma certa solidão, principalmente por conta das perdas naturais que esse ciclo está sujeito, afirma Fonseca.
Esse foi o caso de Eliane Pioli Bassetti, 73, que escolheu fazer o seu intercâmbio, quando passava por diferentes tipos de luto. Suas duas filhas haviam se mudado para outros países, uma foi para os Estados Unidos, e a outra para Singapura, e seu companheiro, juntos há 40 anos, morreu em 2022, um mês depois de sua mãe.
Com graduação em Letras Italiano, ela também escolheu ir para Roma, onde ficou dois meses e aproveitou para fazer também um curso de mitologia greco-romana. Ela conta que desde o primeiro dia já fez amigos e aprendeu muitas coisas.
“Nós temos esse grupo [de amigos de turma] até hoje. Fiz amigas maravilhosas. A gente tinha muita atividade fora, happy hour com pintura, degustação de vinhos”, diz. “Foi maravilhoso pra mim em todos os sentidos, porque inclusive me apaixonei [por uma pessoa] em Roma.”
Boehm acredita que as atividades extracurriculares em um intercâmbio são tão importantes quanto o que acontece em sala de aula. Para ele, é nesse momento que se tem a imersão na cultura e nos hábitos de um país, desenvolve melhor o idioma e cria vínculos, muitas vezes duradouros.
Nas últimas duas semanas de seu intercâmbio, Yara escolheu ficar em uma casa de anfitriões locais e diz que a experiência foi totalmente diferente do que viveu no início, em um hotel.
“Conheci a cultura e o modo de vida das pessoas, foi enriquecedor para mim também ter ficado nessa casa acolhedora. Todas as noites, nós jantávamos e ficávamos conversando, ele corrigia o meu italiano. A gente se corresponde até hoje pelas redes sociais.”
Apesar de ainda representar uma parcela menor do universo de intercambistas, a participação dos viajantes com mais de 50 anos vem crescendo, segundo dados da Belta (Associação Brasileira de Agências de Intercâmbio). Em 2024, a faixa etária alcançou cerca de 7,5% do total, ocupando a sétima posição entre os grupos que mais realizam intercâmbios internacionais.
A psicóloga Larissa Fonseca reforça a importância de escolher um destino que venha de um interesse pessoal, além de buscar se preparar psicologicamente e fisicamente para vivenciar essa experiência.
“A gente vai se sentir inseguro no começo, isso faz parte, mas isso acaba se transformando em confiança a partir das situações que começam a acontecer e eu começo a conseguir resolver ou encontrar quem me ajude a resolver.”
O diretor da EF diz que é papel da empresa entender o que a pessoa está buscando com o intercâmbio, quais os medos e anseios que eles têm para melhor orientá-los. E isso é válido tanto para o país que você escolhe, a duração do programa e a acomodação, além de orientar antes e durante todo o processo.
Colaborou Regiane Soares